A greve de ônibus de Belo Horizonte foi suspensa no começo da tarde desta segunda-feira (16), após uma reunião entre o Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários de BH e Região (STTR-BH) e o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (SetraBH). O movimento grevista trouxe à tona o pedido dos empresários para que ocorra o aumento da tarifa, cujo valor base é de R$ 4,50. Usuários reprovam a possibilidade alegando que o preço já não condiz com a qualidade dos serviços.
Os donos das empresas alegam que estão em “absoluto esgotamento financeiro” diante do aumento dos custos de operação e do não reajuste tarifário – o último ocorreu em dezembro de 2018. Apesar do contrato estabelecer a mudança de preços anualmente, sempre em 26 de dezembro, foi definido o congelamento da tarifa até março deste ano, visto o repasse de subsídio emergencial de R$ 237,5 milhões por parte da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH).
Análise
Além da revisão no preço da tarifa, outro pedido dos donos de empresas é o pagamento de mais subsídios por parte do poder público. “Sei de todas as dificuldades que o setor passa e também os trabalhadores, porém, neste momento, dizer que precisa de subsídio maior e de nova tarifa, você está afrontando o usuário de Belo Horizonte, pois ele acreditou no acordo”, afirma o professor do curso de Engenharia de Transporte do Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet), Renato Guimarães Ribeiro.
O especialista compreende a reivindicação dos rodoviários por melhores salários, porém acredita que o momento não é o ideal. “Não desmereço o direito dos trabalhadores, tanto que nem avalio a reivindicação. Se quando foi firmado o pacto e eles não sentaram à mesa e não gritaram para serem ouvidos [e o reajuste salarial deles ter sido incluído na lei], isso só pode ser posto em março. Se quer pleitear algo, que seja a partir de março e não agora. Senão vamos desrespeitar os acordos”.
Diante do aumento dos custos de operação e principalmente do preço do combustível, o especialista avalia a necessidade de reajuste na tarifa defendida pelos empresários, porém faz uma ressalva. “Necessita do reajuste, pois tivemos o aumento dos preços que foi enorme. Mas este é o momento? Não. Tem que ser em março e não parar o sistema”.
Ribeiro lembra que o problema do transporte coletivo não é restrito à capital mineira. “Não podemos fechar os olhos para uma série de coisas: temos o sistema em crise que precisa ser repensado no país. O usuário não pode ser o único a pagar pelo serviço. A reação do atual modelo é o que vemos em BH e várias cidades: trabalhadores com condições sucateadas, o usuário que não tem o direito de locomover atendido, contratos descumpridos por empresários e gestor público”.
Para mudar a realidade, pensar políticas públicas é urgente. “Espero que as prefeituras, os governos estaduais e federal sentem para que possamos discutir o que faremos. O sistema está caótico e sofreu bastante, principalmente na pandemia de Covid-19”, ressalta o especialista.
Usuários na bronca
O reajuste da tarifa vai recair no usuário que é quem paga pelo serviço. A possibilidade de aumento do preço não agrada quem utiliza os coletivos pela cidade. “Acho um absurdo cogitar o aumento pelo atendimento que fazem ao público. Os ônibus atrasam demais, saímos cedo de casa e só chegamos a noite, as estações sempre estão cheias”, afirma o entregador Márcio José.
Quem também não agradou de ter que desembolsar mais dinheiro para circular pela cidade é a professora Marli Silva. “A passagem já é mesmo muito alta. Os ônibus deixam a desejar. Sempre cheios, no período de chuva fica vazando, estações lotadas. Complicado”.
Aumentar a tarifa do transporte coletivo de Belo Horizonte sem que antes ocorra a revisão do contrato não é viável, conforme destaca Letícia Domingues, integrante do Movimento Tarifa Zero. “Falar de aumento é corroborar com o sistema que é completamente falho. A forma que o sistema opera é de uma forma que não tem transparência”.
“Temos que pensar alternativas pois o subsídio acaba e as empresas vão pressionar por mais tarifa. Temos que recalcular o valor da tarifa começando do zero e pensando o sistema que remunera o quilômetro rodado. Pagar a empresa pelo que, de fato, foi prestado e não com base de cálculo defasada”, complementa.
Em dezembro, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) enviou um projeto para a Câmara Municipal estendendo o subsídio emergencial até abril. Procurada para falar sobre a greve desta segunda, o Executivo municipal informou que “não se resolve o problema buscando solução que não é possível financeiramente ou que seja ilegal”.
“Soluções apressadas e sem respaldo técnico, longe de solucionar o problema, podem, isto sim, agravá-lo, podendo implicar em prejuízo para os milhares de usuários do transporte público da capital”, afirmou em um dos trechos do comunicado que defende a revisão e modernização dos contratos de concessão em vigor.
Também em nota, o SetraBH esclareceu que o subsídio emergencial foi apenas uma forma de viabilizar os custos de operação para que houvesse o aumento de 30% no número de viagens por dia útil, passando de 16 mil para mais de 22 mil viagens. “Portanto, não podendo ser considerado como receita das empresas”.
Por O Tempo