Como Ibirité conseguiu zerar o preço da passagem de ônibus

11/05/2023 | Centro-Oeste, Minas Gerais

O transporte municipal de Ibirité é bancado pela Prefeitura – Foto Denys Lacerda/EM/D.A Press

 

 

Enquanto os moradores de Belo Horizonte pagam a passagem de ônibus mais cara entre as capitais brasileiras, Ibirité, na Região Metropolitana de BH, zerou a tarifa do transporte municipal em janeiro de 2023 e viu a demanda dobrar em menos de três meses: os 170 mil passageiros transportados no primeiro mês saltaram para 350 mil em março.

 

A cidade de 180 mil habitantes é a maior de Minas Gerais a fornecer transporte gratuito para toda a população. Antes, os ibiritenenses precisavam desembolsar R$ 5,30 para se deslocar dentro do município. Desde 29 de janeiro, as catracas estão destravadas e servem apenas para contar o número de passageiros.

 

“A tarifa zero ajuda muita gente. A gente via as pessoas indo para o médico no sol quente com menino pequeno porque não tinham condições de pegar ônibus”, contou ao Estado de Minas a doméstica Vanusa Gonçalves Costa, enquanto esperava pela Linha 1021 (Terminal/São Pedro/Recanto Verde).

 

Mais dinheiro no comércio

 

Vanusa usa o serviço de ônibus diariamente. Assim como outros trabalhadores de Ibirité, ela não recebe vale-transporte desde que as catracas foram liberadas.

 

“A gente crê que isso ajuda na economia da empresa, porque ela pode contratar mais funcionários com menos custos”, comenta Rodrigo Valú, chefe da Divisão de Transportes da Ibiritrans, órgão que gerencia o transporte municipal da cidade.

 

Vanusa acredita que a tarifa zero ajuda, mas reclama da conservação – Foto Denys Lacerda/EM/D.A Press

 

 

Quem paga a conta da tarifa zero?

 

A Prefeitura de Ibirité acredita que, com o tempo, a tarifa zero deva diminuir os custos dos comerciantes e aumentar a circulação de dinheiro dentro do município, defende Rodrigo Valú. “Hoje, os moradores pensam duas vezes antes de sair da cidade para fazer compras”.

 

Se o comércio local vende mais, a arrecadação de impostos aumenta, o que ajuda a bancar a tarifa zero, custeada inteiramente com recursos da prefeitura. “Dá em torno de 1,5% da arrecadação do município”, explica.

 

Cerca de metade do custo da operação dos ônibus é pago com valores que, anteriormente, iam para o vale-transporte dos servidores municipais. “A prefeitura gastava em torno de R$ 370 mil por mês com servidores.”

 

Frota e custo por quilômetro rodado

 

São repassados mensalmente para a empresa operadora do sistema cerca de R$ 650 mil, aproximadamente R$ 5 por quilômetro rodado. Os 23 carros das 11 linhas da cidade rodam em torno de 135 mil quilômetros por mês.

 

O tamanho da frota e o quantitativo de viagens não acompanharam o crescimento da demanda, duas vezes maior do que antes da tarifa zero. Entre as principais reclamações que colhemos com moradores da cidade estão a lotação dos veículos e a pouca quantidade de horários.

 

Segundo Rodrigo Valú, a situação deve melhorar com a entrada de dois novos ônibus em operação no próximo dia 16, e nos próximos meses devem chegar mais. “[A prioridade] é a implantação de novos horários para diminuir a lotação dentro dos veículos.”

 

No caminho de outras cidades

 

Ibirité é a segunda maior cidade do Brasil a adotar a tarifa zero no transporte coletivo – a maior é Caucaia (CE), com 368 mil habitantes. Levantamento do movimento Tarifa Zero BH mostra que 70 cidades brasileiras liberaram as roletas dos ônibus, a maioria com até 100 mil habitantes.

 

Outro levantamento, desta vez da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), identificou que 60 cidades, 18 delas capitais, têm algum nível de subsídio definitivo nos seus sistemas de transporte.

 

Número de passageiros dobrou em Ibirité entre janeiro e março – Foto Denys Lacerda/EM/D.A Press

 

 

Francisco Christovan, presidente da associação, explica que cidades menores têm mais facilidade para custear o transporte municipal, pois, geralmente, possuem redes de linhas mais enxutas, com frota menor e custo operacional mais baixo.

 

“Cidades que têm espaço orçamentário, ou alguma fonte de receita extraordinária, conseguem cumprir com todas as obrigações na área da saúde, da educação, da segurança, da zeladoria, e ainda sobra dinheiro para pagar o custo do transporte sem que o passageiro tenha que arcar com a tarifa”, afirma.

 

Entre os municípios com fontes de receitas extraordinárias que implementaram tarifa zero, Christovam cita os exemplos de Maricá, no litoral fluminense, que recebe royalties pela exploração de petróleo, e Paranaguá, no litoral paranaense, que recolhe tributos pela operação do porto da cidade.

 

Tarifa zero nos ônibus de cidades mineiras

 

Em Minas Gerais, 14 cidades fora da Região Metropolitana de BH zeraram a tarifa do transporte municipal. São elas: Abaeté, Arceburgo, Arcos, Campo Belo, Cláudio, Lagoa da Prata, Mariana, Monte Carmelo, Muzambinho, Ouro Branco, Pirapora, Santana do Deserto, São José da Barra e São Lourenço, segundo o Tarifa Zero BH.

 

Na região metropolitana, a primeira foi Itatiaiuçu, em 2015. Em seguida, Caeté, em 2021. Dados de abril de 2023 mostram que a frota de oito ônibus da cidade transportou 83 mil passageiros e percorreu 26,5 mil quilômetros. O custo foi de R$ 243 mil, cerca de R$ 9 por quilômetro.

 

Ainda em 2021, São Joaquim de Bicas implantou o chamado “Expressinho 0800”. Os sete ônibus da cidade transportam mensalmente cerca de 60 mil passageiros ao longo de 25 mil quilômetros. O custo é de R$ 250 mil mensais, aproximadamente R$ 10 por quilômetro.

 

Mudanças no transporte de BH

 

Desde abril de 2023, Belo Horizonte garante gratuidade para os usuários das linhas de vilas e favelas. A iniciativa foi acordada entre a Prefeitura e as empresas de ônibus após o aumento de 33% na passagem, que passou de R$ 4,50 para R$ 6. Até março, parte da tarifa era subsidiada. Enquanto o repasse não volta, o valor é custeado inteiramente pelos passageiros.

 

O movimento Tarifa Zero BH, que defende um sistema de mobilidade urbana livre de catracas, deve apresentar nos próximos meses um projeto de lei para zerar a tarifa na cidade. Para financiar o sistema, André Veloso, integrante do movimento, cita como exemplo a iniciativa adotada em Vargem Grande Paulista (SP), que liberou as catracas dos ônibus em 2019. Cerca de 70% dos custos são bancados por uma taxa cobrada mensalmente das empresas da cidade, no valor de R$ 40 por funcionário.

 

“O que a gente defende é um Sistema Único de Mobilidade com recursos da União, dos estados e dos municípios, e gestão compartilhada destes três entes federativos. Assim você consegue implantar a tarifa zero em todos os municípios, naqueles com baixa capacidade orçamentária e naqueles com alta capacidade orçamentária, assim como é o SUS.”

 

Por Uai 

 

 

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