Governo pode perder quase 7 milhões de testes para Covid

22/11/2020 | Brasil

Foto Claudio Furlan/Dia Esportivo/Estadão Conteúdo

 

Um total de 6,86 milhões de testes para o diagnóstico do novo coronavírus comprados pelo Ministério da Saúde perde a validade entre dezembro deste ano e janeiro de 2021.

 

Esses exames RT-PCR estão estocados num armazém do governo federal em Guarulhos e, até hoje, não foram distribuídos para a rede pública. Para se ter ideia, o SUS aplicou cinco milhões de testes deste tipo.

 

Ou seja, o país pode acabar descartando mais exames do que já realizou até agora. Ao todo, a Saúde investiu R$ 764,5 milhões em testes e as unidades para vencer custaram R$ 290 milhões – o lote encalhado tem validade de oito meses.

 

A responsabilidade pelo prejuízo que se aproxima virou um jogo de empurra entre o ministério, de um lado, e Estados e municípios, de outro. Isso porque a compra é feita pelo governo federal, mas a distribuição só ocorre mediante demanda dos governadores e prefeitos.

 

Enquanto um diz que sua parte se resume a comprar, os outros alegam que o governo entregou material incompleto, falta de capacidade para processar as amostras e de liderança do ministério nesse processo.

 

O RT-PCR é um dos exames mais eficazes para diagnosticar a Covid-19. A coleta é feita por meio de um cotonete aplicado na região nasal e faríngea (a região da garganta logo atrás do nariz e da boca) do paciente.

 

Na rede privada, o exame custa de R$ 290 a R$ 400. As evidências de falhas de planejamento e logística no setor ocorrem num período de aumento dos casos no país.

 

Validade

 

Os dados sobre o prazo de validade dos testes em estoque estão registrados em documentos internos do ministério, com compilação de dados até o último dia 19. Relatórios acessados pelo “Estadão” indicam que 96% dos 7,15 milhões dos exames encalhados vencem em dezembro e janeiro. O restante, até março.

 

O ministério já pediu ao fabricante análise para prorrogar a validade dos produtos. A falta de outros componentes para realizar testes, um dos problemas que travam o fluxo de distribuição, porém, deve continuar.

 

A pasta diz que só entrega os testes quando há pedidos dos Estados. Ainda ressalta que nem sequer as 8 milhões de unidades já repassadas foram totalmente consumidas.

 

Secretários estaduais e municipais de Saúde dizem que não usaram todos os testes, pois receberam kits incompletos para o diagnóstico, com número reduzido de reagentes usados na extração do RNA, tubos de laboratório e cotonetes de coletar amostras. Também veem dificuldade para processar amostras.

 

Isso prejudica o repasse dos produtos, pois as prefeituras, em especial, não têm como armazenar grandes quantidades.

 

O ministério lançou duas vezes o programa Diagnosticar para Cuidar, que previa 24,2 milhões de exames no SUS até dezembro.

 

Só 20% foram feitos. A pasta prometeu também insumos para entregar kits completos, mas os negócios foram travados por suspeita de irregularidades, hoje sob análise do Tribunal de Contas da União (TCU).

 

Com meta de alcançar 115 mil testes diários no SUS, o ministério registrou em outubro média de 27,3 mil na rede pública, número inferior ao dos dois meses anteriores.

 

Militares com cargos de influência na pasta ouvidos pelo “Estadão” consideram o ritmo razoável. A auxiliares, o ministro Eduardo Pazuello já afirmou que há testes suficientes nas mãos de Estados e municípios.

 

A cúpula da pasta avalia que as amostras excedentes podem ser enviadas a centros equipados pelo ministério, como o da Fiocruz em Fortaleza. Gestores da Saúde ainda dizem que o diagnóstico pode ser feito pelo próprio médico, o que tornaria o RT-PCR menos importante.

 

Especialistas, porém, dizem que o teste não serve só para diagnóstico. É essencial na interrupção de cadeias de infecção.

 

“A vantagem da Europa, agora, é que aumentou tanto a capacidade de testagem que é possível detectar casos leves”, diz o vice-diretor da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), Jarbas Barbosa.

 

Para ele, um bom indicador para verificar se o país testa pouco é o número de positivos. Se for acima de 5%, é sinal de que os testes são insuficientes. No Brasil, cerca de 30% dos exames RT-PCR no SUS deram positivo.

Por O Tempo

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